Em três dias de oficinas e debate
público, coletivos da América do Sul compartilharam práticas de resistência aos
megaprojetos. O intercâmbio realizado no Rio ajudou a consolidar a vigilância
popular ambiental como ação fundamental de resistência à presença das
corporações e seus grandes projetos de desenvolvimento a partir do
empoderamento popular.
Clique na imagem e navegue pelas fotos dos dois
primeiros dias de atividade
De Santa Cruz ao Equador, do Maranhão ao Peru, o
que há de comum e particular na resistência frente aos grandes projetos de
desenvolvimento? Como aprendemos com as lutas na América Latina que resistem à
força do lucro que não respeita a vida e os povos? Durante três dias, jovens,
mulheres e homens de coletivos de vigilância popular ambiental de Brasil,
Argentina, Equador e Peru se encontraram no Rio para trocar experiências e
afetos sobre as pedagogias que emergem dos conflitos socioambientais no nosso
continente. O encontro foi promovido pelo Instituto Pacs em parceria com a rede
Justiça nos Trilhos.
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Fotos: Bárbara Pelacani e Wanessa de Andrade
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No primeiro dia (11/09), os participantes
realizaram uma visita de reconhecimento dos impactos socioambientais em Santa
Cruz, onde puderam ver de perto os prejuízos à população causados pela
siderúrgica TKCSA, recentemente vendida para o grupo Ternium. Uma oficina de
troca de experiências em vigilância popular ambiental marcou o segundo dia de
atividades, 12/09, no espaço Raízes do Brasil, mantido pelo Movimento dos
Pequenos Agricultores (MPA).
Na quarta (13/09), o debate público “As lutas que
educam na América Latina”, promovido pelo Instituto Pacs em parceria com o
Coletivo Haveté e o GEASUR, na Casa Naara, no Centro do Rio, encerrou as
atividades com exibição de vídeos sobre as injustiças ambientais e sociais
gerados por grandes empresas transnacionais e roda de conversa a partir das
falas dos/das participantes da oficina.
Os coletivos de jovens de Santa Cruz, no Rio, e
Piquiá de Baixo, Maranhão, que realizam as medições da qualidade do ar nas duas
comunidades receberam convidados/as impactados/as por grandes projetos de
indústrias petrolífera e petroquímica, siderúrgica e de mineração (entre eles a
extração de urânio). Foram apresentados os enfrentamentos vivenciados pelas
populações de Caitité (BA), Santa Quitéria (CE), Campos Elísios (Duque de
Caxias, RJ), Catamarca (norte da Argentina), Cajamarca (Peru) e da Amazônia
equatoriana.
“Além de promover o intercâmbio e a sistematização
dessas experiências, o encontro ajudou a consolidar a vigilância popular
ambiental como ação fundamental de resistência à presença das corporações e
seus grandes projetos de desenvolvimento a partir do empoderamento popular”,
aponta Gabriel Strautman, coordenador-adjunto do Instituto Pacs.
Clique na imagem e acesse a fotografias do debate
realizado na Casa Naara
Sebastião Braga, morador de Duque de Caxias,
destaca que os problemas enfrentados pelas diferentes comunidades reunidas no
encontro são muito parecidos. “Quando vejo a experiência do Equador parece que
estou falando da minha cidade, quando falamos de câncer, doença de pele”,
aponta. Braga destacou a cultura de cura desenvolvida entre os povos da
Amazônia equatoriana, que dificilmente seria possível de ser posta em prática
em Campos Elísios, em Caxias, por causa da falta d’água. “As máquinas não
morrem de sede. Para as indústrias da REDUC não falta água”, compara Sebastião,
membro do Fórum de Atingidos pela Indústria do Petróleo e Petroquímica nas
cercanias da Baía de Guanabara (FAPP-BG).
“Foi fantástico o encontro, mas fico triste em ver
como todo mundo sofre com o capital devorador, desumano, que explora e vai
embora. Ele não tem nacionalidade. É totalmente voraz. Quando o homem vai
entender que o dinheiro não se come? No dia que acabar com tudo?”, resume
Braga.
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Fotos: Bárbara Pelacani e Wanessa de Andrade
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Para Carlos Aldaz, da Clínica Ambiental, o encontro
foi rico porque dá força para seguir nas lutas e a entender que “não estamos
sozinhos”. Ele se mostrou surpreso com os impactos da siderurgia no Brasil e
disse que levará ao Equador os conhecimentos trocados no encontro. “Temos
esperanças de avançar juntos e criar enlaces com pessoas que vivem problemas
similares”, aponta. A Clínica Ambiental desenvolve atividade de reparação
socioambiental frente às atividades petrolíferas no Equador.
Mirtha Vásquez, de Cajamarca, no Peru, convida
ao hermanamiento (irmanação, em português) dos povos
latino-americanos para enfrentar os grandes projetos de desenvolvimento. “Mãos
juntas, com mais organização de nós que fazemos a resistência, podemos derrotar
esse monstro grande que pisa forte”, argumenta. Assim como campesinos e
indígenas peruanos, que se juntam para fazer trabalhos agrícolas em comum (minga, como
se diz especialmente no Peru e Equador), Mirta aposta na possibilidade de
tecermos uma grande rede de jovens, homens e mulheres “para não permitir mais
mortes nos nossos territórios”, resume Mirtha, integrante do Grufides (Grupo de
Formação e Ação para o Desenvolvimento Sustentável).
Sebastián Pinetta, da organização argentina
Bienaventurados los Pobres (BePe), destaca a importância que acumulou, a partir
de assembleias, setores populares e povos originários, de ser necessário
conhecer os processos de extração, consumo e violação de direitos, a partir de
uma visão ampla, que as grandes empresas vêm realizando no continente.
“Onde paremos e olhemos, salvando as
particularidades de cada processo extrativo e de cada comunidade, reconhecemos
como as grandes empresas operam da mesma maneira”, argumenta Sebastián. Ainda
segundo ele, não importa nas mãos de quem estejam esses projetos, eles vão
sempre sugar a vida dos territórios, matando e causando dor. “A discussão sobre
o modelo extrativo, sobre o ‘pacote tecnológico’ que tira nossas identidades e
bens comuns, é claramente contra a qual temos que seguir construindo
alternativas e dizendo não”, arremata.
Conheça um pouco mais sobre as
experiências apresentadas na oficina no Rio
Coletivo Martha Trindade – Santa Cruz
– Rio de Janeiro/RJ –Brasil
Jovens do bairro periférico de Santa Cruz na cidade
do Rio de Janeiro organizados em resistência aos impactos causados pela maior
siderúrgica da América Latina, TKCSA, com foco no processo de Vigilância
Popular em Saúde, no qual se realiza a medição da qualidade do ar do bairro com
objetivo de verificar a poluição atmosférica causada pela siderúrgica. Processo
esse realizado junto ao Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
(PACS), a Organização Justiça Nos Trilhos (JNT) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Coletivo de Jovens de Piquiá de Baixo
Jovens de Piquiá de Baixo, bairro periférico da
cidade de Açailândia no Maranhão, organizados em torno da resistência aos
impactos causados de cinco empresas siderúrgicas no território. Compartilham
com o coletivo de Santa Cruz, o PACS, a JNT e a Fiocruz, o processo de
Vigilância Popular em Saúde realizando as medições da qualidade do ar no
bairro. Anterior a esse processo a comunidade de Piquiá de Baixo conseguiu ser
reassentada através da luta dos moradores e dos impactos evidentes causados
pelas empresas. O reassentamento ainda está em processo de execução.
FAPP –
BG – Fórum dos afetados pela Indústria do Petróleo e Petroquímica nas Cercanias
da Baia de Guanabara – Rio de Janeiro
O FAPP é um grupo formado por diferentes atores
sociais em torno da denúncia e práticas de resistência relacionadas com as
injustiças ambientais e vulnerabilidades causadas por unidades industriais de
petróleo e petroquímica na Baía de Guanabara. Estão iniciando um processo
de vigilância ambiental junto à Escola Nacional de Saúde Pública da
FIOCRUZ/IPPUR e PROURB – UFRJ, identificando os conflitos relacionados à água
no entorno do Polo Petroquímico e análise da qualidade da água (aspectos
biológicos e físico-químicos).
BePe (Bienaventurados
los pobres) – Catamarca / Argentina
Organização que resiste aos impactos gerados pela
mineração na cidade de Andalgála no norte da Argentina. Como prática de
vigilância popular realizam um processo de identificação dos problemas de saúde
causados pela mineração no território a partir da percepção dos moradores.
Estão construindo de um estudo epidemiológico do tipo descritivo com a
finalidade de conhecer, desde a própria visão e percepção da comunidade as
enfermidades emergentes e crônicas em Andalgála, e sua possível relação com o
desenvolvimento de atividades econômicas produtivas vinculadas a mineração a
céu aberto.
A Clínica Ambiental surge em 2008 como uma proposta
de reparação integral da saúde diante dos graves problemas que atravessam a
Amazonía Equatoriana. Tem sua sede principal na cidade de Lago Agrio, zona
afetada por atividades petroleiras, fumigações aéreas e uso indiscriminado de
pesticidas em monocultivos da região. A reparação proposta vem desde dentro e
de abaixo, que inclua o solo, as plantas, animais, as pessoas em zonas de alta
exposição a contaminantes, desde a recuperação do tecido social e do
ecossistema.
Grufides – Grupo de
Formação e Ação para o Desenvolvimento Sustentável – Cajamarca/ PERU
Organização que desenvolve junto a coletivos
territoriais de Cajamarca ações de incidência e fortalecimento de capacidades
frente a problemática ambiental, enfatizando no direito a água. Especialmente
frente às atividades extrativistas, os riscos de desastres, promovendo sistemas
de produção ambientalmente sustentáveis e economicamente solidários, como parte
da construção do Bem Viver. Realizam diretamente ações a partir de comitês de
vigilância ambiental em rios e bacias hidrográficas, identificando a poluição
causada por atividades extrativistas na região e seus impactos sociais e
ambientais.
Caso de Mineração de Urânio em Caetité (BA) e Santa
Quitéria (CE). Relatos do professor e pesquisador Renan Finamore sobre o
processo de Vigilância Popular em Saúde realizada junto à comunidade de
Caetités e da mestranda do IPPUR-UFRJ, Bruna Sarkis, sobre riscos, saúde e
alternativas de produção de conhecimentos para justiça ambiental nas duas
comunidades.
Assessoria de Comunicação
Rede Justiça nos Trilhos
Acesse:www.justicanostrilhos.org
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